sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Actividades a mais?

Artigo de opinião da revista Pais & Filhos sobre a sobrecarga de actividades extra-curriculares a que muitos vezes as crianças estão sujeitas.

 

Maria Jorge Costa
ladrões do tempo

Agora que a escola já começou e a família se começa a acomodar aos novos ritmos, surgem as dúvidas quanto à melhor escolha das pomposamente chamadas de AEC, actividades extra-curriculares. Até há uns tempos ninguém conhecia este palavrão para designar o que as crianças faziam depois da escola. Eram actividades. Ponto final. Mas com a sua inclusão no ensino público para o prolongamento do horário escolar para além do horário normal decidiram chamar-lhes AEC. Que está certíssimo, mas dá um ar ainda mais pesado a um tempo que tem de ser pensado e gerido com pinças, para não sobrecarregar meninos e meninas, que, de qualquer modo, já estão demasiado tempo em aprendizagens formais.
Claro que seria muito mais fácil se, depois de um ciclo de escola (de manhã ou de tarde), as crianças pudessem ir tranquilamente para casa a pé, ou com mãe, pai, avós, tios, etc. e assim terem tempo para descansar, brincar, brincar e algum tempo para os trabalhos de casa. Mas pais e mães têm horários de trabalho apertados, muitos avós ainda trabalham e a família alargada não existe.
Seja por necessidade de os manter numa qualquer actividade depois da escola, ou por querer «entupi-los» de formação extra para serem mais competitivos no futuro, vamos roubando, todos os dias, aos nossos filhos, o tempo de brincar. De pais carinhosos e preocupados, passamos a ladrões do tempo, de forma inconsciente. E de um tempo precioso que os estrutura, lhes permite digerir informações e emoções do dia.
No fundo, tempo para nada é um tempo que os organiza.
Brincar à toa, brincar sem ordem nem nexo, correr rua acima, trepar às árvores, jogar futebol, ao elástico ou à macaca, andar de skate. Livres, sem organização prévia.
Os recreios das escolas – quando há espaço – seriam um local ideal para se promover essa brincadeira, mas, por mil e um constrangimentos, não pode ser. Perante estes cenários, as famílias organizam-se para ocupar em segurança o tempo dos filhos (ver página 40). Natação, outra actividade desportiva, música, línguas, teatro, dança, as opções multiplicam-se para encher o dia, de maneira a ficar compatível com os horários dos pais. Quando a dura jornada de nove ou mais horas termina, os miúdos estão cansados, rabugentos e a pouco tempo de terem de ir dormir para aguentar o ritmo. E muitos ainda têm trabalhos de casa para fazer.
Sobre o dormir não se pode abrir mão, pelas implicações que tem ao nível físico e cognitivo. Está então na hora de a família se sentar, reflectir e pensar bem o que pretende fazer, que vida se dispõe a dar aos filhos.
Se para os adultos é uma canseira andar de um lado para o outro, imaginem o que sentirão as crianças? Este ano é preciso mudar, planear melhor. Com menos stresse serão todos mais felizes.

 

in Revista Pais & Filhos